quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Harry Potter e a Mulher de Preto

- Meu amigo, eu estou te dizendo que meu filho tem mais de 12 anos! - bradou minha mãe furiosamente na bilheteria do cinema.
- Minha senhora, eu estou vendo aqui a identidade do seu filho, e ele só tem 10 anos. Sinto muito, ele não vai poder assistir o filme.

E foi assim que, em 1999, eu fui impedido de ver "O Sexto Sentido" no Multiplex Iguatemi. Tive que me contentar com o lançamento em VHS, dublado, e sem o devido impacto que sua exibição havia causado no cinema. A vingança somente veio 2 anos depois, com "Os Outros", ambientado na década de 40, com uma Nicole Kidman no auge da beleza - e numa interpretação que lhe rendeu o Globo de Ouro - , uma mansão mal-assombrada, sussurros, sombras, e portas que se movem sozinhas.
Assim, não é surpresa que seja esse filme o meu padrão de suspense fantasmagórico, e tudo o que veio após seu lançamento, em 2001, ainda não o havia superado. Alguns se destacaram, confesso, como "O Exorcismo de Emily Rose" e "Atividade Paranormal", mas nenhum deles era capaz de ganhar da história da mãe amargurada, rígida, atormen
tada e fanática religiosa (Nicole Kidman) que assassinava os próprios filhos. Não que "Os Outros" seja mais assustador que "Atividade Paranormal - nunca será. Mas esse último é muito mais um exercício de estilo do que um filme de terror propriamente dito - ainda que meta medo, muito medo.

Fato é que desde criança minha mãe me apresentou aos clássicos do horror americano - "O Iluminado", "O Exorcista", "O Bebê de Rosemary", "A Profecia", e por aí vai - então posso dizer que o cinema sobrenatur
al seja minha especialidade. Eu gosto de sentir medo, e gosto mais ainda daquela sensação terrível de chegar em casa após um bom filme de terror, e ficar imaginando que um fantasma vai aparecer no seu quarto a qualquer instante. E nesse quesito, os lançamentos da última década estavam deixando muito a desejar.

Aí algum anjo resolve finalmente adaptar a história de "A Mulher de Preto" (livro de 1983 e peça de sucesso em Londres desde 1987) para o cinema. E temos então todos aqueles pulos na poltrona, gritos, gente saindo da sessão no meio do filme, taquicardia, respiração ofegante, uma dose cavalar de adrenalina circulando nas veias, e toda a satisfação de morrer de medo com uma trama boba, porém consistente e magnificamente fotografada e dirigida. Assim é o novo "A Mulher de Preto", com o astro de 'Harry Potter', Daniel Radcliff, e outros atores de ponta do cine
ma britânico.

Daniel Radcliff, por sinal, faz um ótimo trabalho como o advogado viúvo que precisa descobrir um testamento perdido dos antigos moradores de uma mansão mal-assombrada num vilarejo da Inglaterra no começo do século XX. Nota-se claramente o seu esforço em se d
esvencilhar do estigma de Harry Potter, mas após tanto tempo trabalhando na saga, é impos
sível não associá-lo ao bruxo, principalmente na cena que um trem atravessa uma bucólica pai
sagem do interior da Grã-Bretanha - quem não se lembrar do Expresso de Hogwarts imediatamente é por que viveu em outro planeta nos últimos 10 anos.

A fotografia e a direção de arte no filme são impecáveis. A Mansão mal-assombrada, por si só, consegue ser mais assustadora que um beco do Pelourinho, que véspera de prova de Eduardo Sodré, que show d'A Bronkka de graça no Jardim dos Namorados, que o Iguatemi em véspera de Natal, mais assustadora que...enfim, é muito assustadora mesmo. A trama em si, como já disse, é bem simples: uma lenda de um espírito demoníaco que inferniza criancinhas inocentes e as instiga a cometer suicídio. O espírito, como vocês já devem ter imaginado, é a tal mulher de preto. Simples, não falei?

Mas é o conjunto da obra que faz o filme ser uma experiência tão fascinante - a reconstituição histórica, o bem-construído clima de tensão, as boas sacadas do enredo, os sustos totalmente previsíveis, as pessoas saindo apavoradas no meio da sessão no cinema e a reunião de todos os clichês possíveis de uma boa história de fantasmas. Não tem sangue escorrendo, nem tripas voando na tela - o terror é totalmente sugerido, e das maneiras mais óbvias, seja por meio de vultos macabros ou um reflexo no espelho. Trata-se de uma bela homenagem e referência aos filmes de suspense de antigamente. E tudo me fez lembrar daquele dia em que éramos eu, aos 12 anos, Nicole Kidman, uma cortina que se abre sozinha, um piano que insiste em tocar durante a madrugada, e uma velha médium que abre armários. "A Mulher de Preto" ainda não é melhor que "Os Outros", mas não podemos negar: ele chegou pertinho.

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